domingo, 29 de julho de 2018

O CULTO - FICÇÃO INDIE SOBRE O PREÇO DAS PRÓPRIAS ESCOLHAS.


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O CULTO - THE ENDLESS -  é um daqueles filmes de difícil classificação, assim como de difícil degustação. Tem proposta de ficção científica, terror fantástico, suspense, humor negro e drama familiar, nos oferecendo mais perguntas do que respostas. Então se você gosta de roteiros mais didáticos e explicadinhos - e não há nenhum mal nisso - O CULTO, não é o seu lugar.

Os diretores são Justin Benson e Aaron Moorhead que também produzem, roteirizam e protagonizam o filme. Assim repetindo o mesmo êxito -'baixo orçamento + criatividade' dos filmes SPRING, de 2016 e RESOLUTION, de 2014, também assinados pela dupla.

Vamos à trama. Dois irmãos entediados e frustados com seu cotidiano resolvem voltar à comunidade sinistra que fugiram quando eram mais jovens. Depois de um entediante dia de trabalho, encontram na soleira da porta um pacote com uma fita vhs do tal culto. As imagens familiares despertam no irmão mais novo a vontade de se reconectar com o passado, já nebuloso em sua memória. Apesar da relutância do irmão mais velho, resolvem fazer as malas. Melhor o risco da aventura do que uma vida sem amigos, sem garotas e um emprego medíocre.

Ao partirem para estrada com um carro alienado, pouco combustível e com uma bateria pra lá de vencida, antes de chegar a tal comunidade, uma conversa já revela a figura do irmão super protetor que faz de tudo para proteger o ingênuo caçula. E esta questão moral-familiar, além das querelas com o sobrenatural, irá permear todo o roteiro. Muitas vezes iremos nos perguntar se as cenas explícitas de 'terror' querem nos mostrar as questões reais da obra ou se estas questões estão nas bordas, nos limites, fora do campo de visão; assim como um truque de ilusionismo.

A tal seita os recebe de forma calorosa - comida fresca, sorrisos e alojamento confortável. Apesar das coisas já parecerem estranhas - uma coreografia de pássaros sem sentido, estacas fincadas no chão sem motivo aparente e um hostess com o sorriso super sinistro -, complicam ainda mais quando as certezas do irmão mais velho são colocadas em cheque. Será que estes caras do culto só querem uma vida tranquila e comunal e tudo não passou de um mal entendido? Não é melhor ficar na seita de boas do que ser mais um looser na cidade grande? Atiçando os conflitos se destacam Tate Ellington, como Hal, o 'líder' do grupo e Callie Hernandez como Anna. Ambos costurando ardis precisos para cada um dos protagonistas. São conduções sutis de interpretação - uma expressão de canto-de-olho, um sorriso dúbio ou um toque de dedos.

Bom, não é spoiler revelar que coisa vai ficando preta e o acampamento tem muito mais do que karaokê na madrugada, joguinhos em volta da fogueira e cerveja artesanal. Aos poucos a trama nos coloca num labirinto estilo 'cube scape', fissuras espaço-temporais e dilemas tão complexos quanto o eterno retorno de Nietzsche. 

O CULTO, faz parte daquela galeria de filmes do tipo A CHEGADA e DONNIE DARKO que não saem da sua cabeça no subir dos créditos. É entretenimento indie, de baixo orçamento, mas incrivelmente inventivo e reflexivo. Tão divertido quanto cabeçudo.

sábado, 14 de julho de 2018

Samantha! Não é mais uma produção sobre os anos 80.

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Parece que a onda oitentista ainda não passou. E a tal década perdida é pano de fundo (de novo...) para a mais recente produção nacional da Netflix: Samantha! Comédia rasgada dirigida por Luis Pinheiro e Julia Jordão, ambos com experiência na tv fechada e com o mercado publicitário. Alice Bragaestrelada em produções brasileiras (Cidade de Deus) e no exterior (Ensaio Sobre a Cegueira, Cabana, entre outros), encabeça a produção 
Emmanuelle Araújo é Samantha! (com ‘!’). Uma atriz que faz de tudo para resgatar fama dos tempos de estrela infantil quando era o rostinho principal da Turma do Balão Mág....ops... da Turminha Plimplom. A série apresenta sem filtro sua trajetória: da criança psicopata no auge da carreira à sua maturidade como celebridade esquecida com dois filhos pra criar. 

                                                

Emmauelle está ótima, engraçada e super à vontade neste terreno já desbravado com sua Gretchen  em Bingo: O Rei das Manhãs (2017, Daniel Resende). Samantha tem camadas inescrupulosas quando corre atrás de seus objetivos, como também mostra afeto no seu núcleo familiar. Aliás, elenco todo é uma excelente surpresa e entregam personagem hilários, absurdos e por vezes tocantes. Daniel Furlan (Marcinho), como o empresário fuçador de oportunidades; Douglas Silva (Dodói), o par amoroso em busca do seu lugar no mundo como pai e ex-celebridade do futebol, e as crianças Sandra Nonata e Cauã Gonçalves, como os irmãos Cindy e Brandon, que são a cara da Geração Z. Destaque de luxo para Ary França como Zé Cigarrinho, cuja estória pessoal conduz os destinos dos personagens até o final da temporada.  
                                     
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Destila-se toda nossa perspectiva debochada dos anos 80merchan politicamente incorreto, a sensualidade peculiar da época e as deliciosas lendas urbanas: facas escondidas em brinquedos, obscuras mensagens subliminares e uma tal perna mecânica que ninguém viu, mas todo mundo já ouviu falar. Partindo dos ’80, a série é contemporânea e tem um repertório de piadas que estão aí neste mundo-líquido-de-meu-deus: os realities como depositório de ex-celebridades, o falso engajamento ideológico dos youtubers famintos por likeseaster-eggs aos montes (tem um político muito bom na cena do banheiro da boate) e uma inteligente sacada entre a cegueira dos fãs analógicos e digitais. 
Apesar de algumas derrapadas pontuais nos diálogos, o ritmo de sitcom e a edição assertiva faz com que não você largue destes doidos varridos até o último capítulo. É verdade. Vi numa só tacada. Morri de rir. Ainda que com humor ácido é uma série quentinha para nossas férias de inverno. É humor brazuca para os brazucas. Minha filha de 15 anos soltou o seguinte petardo ao final da maratona: “É uma série hilária que te abraça”. Então, Ponto para Netflix!