terça-feira, 17 de dezembro de 2013

AUSÊNCIA

Eu não estava lá na hora que o amor foi embora
Faltei no dia. Estava noutro compromisso.
Quando cheguei em casa, percebi a ausência...
Um peso sobre os ombros, uma quentura na face

Cadê que eu não vi isso, meu Deus?
Será que já se ia este amor cansado
dilacerado pelas negras circunstâncias?
Cadê a tal luz de esperança?
A promessa do "para sempre"?

E eu não estava lá...
Talvez já há muito tempo distraído
Talvez já há muito tempo acostumado
com o silêncio dos cômodos

O sofá não deformado
O controle remoto sempre no mesmo lugar...
A cama bem feita de um lado
A pia limpa e o mesmo único prato sujo.

Eu que já estava longe faz tempo...

Eu que já tinha ido embora
e nem tive a decência de te dizer adeus...

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Fone de ouvido enrolado no dedo

Eu me sinto só
Mas único, na falta de mim.
No escuro do quarto escuro
no feixe de luz no taco do chão
Eu me sinto só
Na mudez da velha mobília
Na anomalia de existir
Somente para mim, neste momento.
Copo d´água
Roupa no chão
Unha roída
Fone de ouvido enrolado no dedo...
Alguém gritou a vizinha da janela
Não era eu, não era ninguém
Sozinho só me dá a agonia
De que em algum momento

Me venha companhia.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Eu: Calendoscópio



Eu queria ter te um pouco
por pouco / eu não estive aqui
Se eu ficar igual a um louco
De novo / eu torto
posso me ferir

Posso ter te em gotas claras
tão raras, migalhas
só pra me servir
Se tenho doses miligramas
às favas, fulanas
me contenho em ti

Eu tenho mais pra te dar
Do que meu espaço na sala de estar
Do que meu líquido seminal
derramado em teu horóscopo

Eu tenho mais pra te dar
esfumaçar-te com meu ópio
Você o vidro final
e eu caleidoscópio

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Schwrmut

(melancolia)

Gotejam sonhos de outrora
spleen, spleen, spleen
entre tempos automatizados
entre sermos hipnotizados
pelo entretenimento inequívoco
e sensoriante

Quando não te "curtem"
nem te "compartilham"
e nem te "comentam"

Goteja do canto da boca
spleen, spleen, spleen
Marcas do travesseiro no meu rosto
Na madrugada
na manhazinha

Por algum tempo
nada tem sentido
nem mesmo o próprio corpo
que de propósito
por pura teimosia, vive

Estou doido para faltar luz
e ouvir os aplausos da vizinhança
no seu inesperado retorno.

Spleen, spleen, spleen.

[Então]
Dance, dance, dance, dance, dance to the radio
Dance, dance, dance, dance, dance to the radio

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Assimetria

Essa coisa de assimetria
me atrai
me dá alegria
Você d'outro lado da rua vai
eu lá na tal avenida

Essa coisa de assimetria
me atrai
isso me arrepia
como susto
um incesto
de insetos na pia

Essa coisa de assimetria
elefantes em plena agonia
na piscina do cara da esquina
no mar - o índico indica

Essa coisa de assimetria
me atrai
me dá ojeriza
Essa coisa de assimetria
meus dedos
sua perna fina
meus pêlos 
sua trança acrílica
meus selos
nos e-mails não ficam
no entanto
o que significa
tamanho
documento medida

Essa coisa de assimetria 
me atrai.
me regula na régua
na relva da selva
pubiana arredia
essa coisa assim
essa assimetria

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Erro 404

Página não encontrada
Este conteúdo não está disponível para seu país
Censura revelada
Not safe for work
Este bando de entulho na tela nos deixa feliz

Erro 404
Estou de quatro
Quando cai a energia de noite...
Quando não tem luz do sol
isto é irrelevante demais...

Aliás, quantas vezes brinquei na grama?
Quantas vezes beijei fulana?
Quantas vezes caí na lama?
E achei entediante o som de Brahma
E torci o nariz pro fórminx
A pra chama ameaçadora do som de Hendrix

Página não encontrada
Este conteúdo não está disponível por ser enfadonho
Por ser lento demais pra seguir com o olho
Por ter um raciocínio decimal
Por representar desvelar a presença
transparente do mal.

Me conectei com Deus
Mas rede caiu.

terça-feira, 16 de abril de 2013

Melhores Amigos

Eu tomo cerveja
Eu jogo baralho
Eu abro a mão
numa biriba insólita

Eu toco guitarra
Madrugo na praça
Política e religião
Ébrios são sãos

São todos adultos
São todos caretas
São todos vultos
Distantes e muito
Fumando maconha
e jogando Atari

Vem Peter Gast
Henri Matisse
Joseph Haydn
Awoledjê
e também Arjuna
o alien Jeriba
Brod era brother
e Tom Jobim
e Gilberto Gil
e o Kledir
Milton Nascimento/Elis Regina

Cleberes santos
Cláudios soberbos
Alvos Alexandres
Altos Renatinhos
Tranças Marcelos
E isso tudo
E outros aqueles
melhores que outros
são todos povo
na Mário Carpenter
subúrbios de novo
No meio do ovo
no meio do mundo
Skid é um padre
Edu é um monge
Vinho e ponche
Pipoca moderna
Pipoca do lixo
São todos gigantes
São todos gigantes
São todos gigantes
São todos gigantes
...

sexta-feira, 12 de abril de 2013

A SAUDADE É ASSIM...

Vez em quando ares passados querem tomar fôlego
Cansam-se de tanto enterrados na alma
/Lamentam-se sôfregos e intestinos /
Querem ontem mudos, hoje gritarem barítonos

Surgem em inspirações erráticas
Em piscares lentos, quase escuros
diminutos, quase desvarios

São pensamentos sufocados
Labaredas mortas-vivas
Focos esquecidos nos escombros da memória

São fantasmas arredios, miasmas lacrimosos
Arrepio repentino ao atravessar a rua
No meio do tráfego
Na insônia sudorípara
Na apneia que nos desperta

Tremem os dedos sujos
A boca amarga e deserta
Um ensurdecimento trágico
Num micro-segundo alerta

A saudade é assim
cegueira labiríntica
A saudade é assim
miragem quase mítica

Exorcizam-se demônios
mas a saudade fica.

terça-feira, 12 de março de 2013

Bate à porta

De manhã
a morte bate à porta
bate à porta
toca a campainha
a morte

Vem de carta
vem de courrier
chega às vezes pelo rádio
pela tv
a morte

a náusea escurece
cresce taquicardia
anestesia
maresia de chumbo

sem lágrimas: uma lembrança torta
Vez em quando bate à porta
a morte

Aquele conhecido do Seu Zé
A irmã da dona Maria
Minha prima de Osasco
Tão jovem

Dor fria esta...fria...fria
Uma fresta venta na janela
fria/ no flamular da cortina arredia
o silvo noturno anuncia
logo vem a manhazinha...

toc-toc-toc
toc-toc-toc
pééééééééééééééééé
pééééééééééééééééé

Como é bom rever (ouvir) velhos amigos


Leaving
Pet Shop Boys
Elysium
Parlophone
2012

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Musas

http://g1.globo.com/mundo/noticia/2013/02/etiope-se-torna-1-mulher-negra-vencer-concurso-miss-israel.html

Eu preciso de musas
mesmo que sejam intrusas
Assim que vier o entrudo
que venham as musas!

Eu preciso de musas
mesmo aquelas confusas
mesmo as semifusas
que me gritam difusas

Eu preciso de musas
mesmo que olímpias matutas
mesmo que urbanas fagulhas
preciso de musas

Musas mães, musas filhas
musas primas e musas putas
dentro ou fora das condutas
carnais e impóluto-absolutas

Preciso de musas negras
hereras, latinas, alvas
mamelucas, índias e ruivas
desfilam etno musas!

Assim etéreas e platônicas
Amantes efêmeras biônicas
Maduras e jovens sônicas
Finas, catitas e suburbônicas!

Máquina - Vidro

Vidro
Máquina
Máquina
2013

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Preto no Branco no Preto no Branco

o bafo meticuloso do tempo
em seu pescoço

o bafo meloso do tempo
denso arrepia

dissolver a vida é arte
coagular o tempo é falsa terapia

medo e coragem
selvagem e humano equilibra.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

BOSTON


Existem sonhos indecifráveis
desejos polutos e hostis
Anacoluto, onde omite estes
versos quebrados inconsequentes

Gostos úmidos e agradáveis
Flashes temporais e gris
Vigor onde a mente pulsa
Urram verbos proeminentes

Pecados trancados a sete chaves
Quando penso que vou mudar de ares
Atravessa-me um pânico de verdades
Das cidades, bicho, Boston é a mais hard

I'm gonna take you by surprise
And make you realize,...

Esta minha teimosia de amor
Este morrer em litorais desertos
Estou certo, estou em estado de choque
Das cidades, parceiro,Boston é mais punk rock

Alí ao lado do cotidiano
onde seu sorriso me inspira
Um anjo me diz que te amo
Um homem sem fôlego ainda respira

Um crooner num pub inglês
Uma paixão fora do tom
Se a guitarra agora tem vez
Vem de lá de Boston, (de Boston!)
em mil novecentos e setenta e seis

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

SOU HOMEM


Eu sou apenas um homem
Um homem.
Tenho guardado os sonhos
Como brinquedos
Tenho filtrado aflições
Como folguedos
Tenho guardado segredos
Por que sou homem.

Sou limitado e enquadrado
Tenho violência e sexo
Tenho a doçura tensa
Imensa e paternal
De um homem

Sou o primeiro a apagar o incêndio
E último a irritar-te com meu silêncio
Ao teu grito silencio-me
Por que sou homem.

Tenho pêlo no corpo como um homem peludo
Alguns indepiláveis em lugares escuros
Outros culturalmente pêlos esdrúxulos

Tenho chorado no adeus
Tenho um copo de coisa pra me consolar
Tenho os pés descalços na sala de estar
Por que sou homem

Tenho acreditado em Deus
E sou um sacerdote em meu lar
Deus é sangue bom é parceiro e fecha comigo
Meu fiel meu amigo
No para-brisa adesivo: ele Mesmo
e meus outros amigos

Tenho amigos como irmãos
Mesmo aqueles que não são sãos
Tenho um animal de estimação
Tenho minha toalha jogada no chão
Um par de chuteiras que não penduro não
E um desvelhecer que perdura então
Por que sou homem.

Deixa meu orgulho falar
Deixa meu dedo em riste apontar
Deixa eu escrever a civilização
Deixa eu lavar a roupa suja
Com discrição
Por que sou homem

Da seita hermética e explícita dos homens.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

MANADA DO ANAGRAMA

Tudo que eu queria na vida
era escrever uma letra só
uma nota só, um samba só
um botão que não se sentisse só

Era poder dar um laço
sem querer deixar espaço
pra fazer a mágica do nó

É lembrar obtuso                                                              (de ser o Homem-de-Aço)
do seu verso confuso
do tom grave em seus olhos

Engolir seco o ocaso
Sem lembrar dos pedaços
Salgados negros do alho

É ter a rima perdida
lá na última esquina
onde um homem está de pé

E dizer que te amo
E de longe acompanho
ondas tristes em Jaconé

Talvez de Botafogo
Talvez ser tijucana
única gentílica se quiser

tem os olhinhos puxados
a covinha engraçada
a garotinha virou mulher

Eu esbarro na letra
Eu desfaço o nó
a juventude em sândalo

O anagrama secreto
a missiva eu acerto
para não ter escândalo

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

DEDICATÓRIA TELESINÁPTICA (daquelas que jamais são entregues em mãos)

Te vi iluminada entre livros/
o entardecer me deu esta imagem de presente/
o que mais da cidade agora é suficiente?/
do que este entardecer que se obscura/
nos teus olhos delicados, entre a fria arquitetura