PILARES: CRÔNICA DE UM BAIRRO DE PASSAGEM

Pilares é um bairro de passagem. Incrustado entre Abolição, Encantado, Piedade e Engenho de Dentro. Pilares não tem jornal de bairro, não aparece nas colunas diárias nem nos noticiários de TV. Não é citado em novelas, nem em crônicas, nem na História. É pior do que o Largo do Machado que, pelo menos, fica na zona sul. Pilares fica na zona norte. Nem sua estação de trem tinha originalmente o nome do bairro, antes era Cintra Vidal. Pilares é um bairro invisível. “Você mora aonde mesmo?”; “Pilares, perto do Méier”; “Ah! Méier eu conheço”. Porém Pilares não fica perto do Méier. Mas é assim que os “pilarenses” se viram ao preencherem um cadastro de cartão de crédito ou no bate-papo na hora do almoço.
                Injustiça! Pilares é um dos bairros mais aprazíveis da zona norte. Se não falam mal  nem bem é porque é bom de morar. Excelente! Seus supermercados, bancos, lojas, lanchonetes. Tem uma vizinhança amigável, uma comunidade católica tradicional, escolas públicas e particulares e uma escola de samba. É! Tem uma escola de samba. Grêmio Recreativo Escola de Samba Caprichosos de Pilares. A expressão máxima da cultura popular!
Geralmente escreve-se sobre a origem dos personagens, das instituições, dos monumentos. Piedade está na História como o bairro da trágica morte de Euclides da Cunha e a cantora Aracy de Almeida era conhecida como a “Dama do Encantado”. Mas, remando contra a maré, atrevo-me a escrever sobre a origem do esquecimento. Por que um bairro com um baixo índice de violência, uma rua dedicada ao comércio, berço de funcionários públicos foi condenado ao limbo. Está aí o desafio.
                Pilares é um dos bairros percorridos pela atual Av. Dom Hélder Câmara, antiga Avenida Suburbana. A Avenida Suburbana era um importante trecho do Caminho Imperial – estrada utilizada pela família real desde o primeiro reinado. O Caminho Imperial era a principal via da Estrada Real que ligava o Rio de Janeiro a Minas Gerais, nos séculos XVII e XVIII. Atualmente, existem marcos ao longo da Avenida Dom Hélder Câmara recuperando a memória do traçado original. O “largo dos pilares” deu origem ao nome do bairro. Era neste trecho do Caminho Imperial que as tropas dos Imperadores e ademais tropeiros amarravam seus cavalos em vários “pilares” para que estes bebessem água. Ali, no largo dos pilares, tinha uma importante fonte de água mineral. Em 1934 foi erguida a Paróquia de São Benedito de Pilares. Imponente, ocupa a parte alta do largo de Pilares. Em seu site a paróquia registra outra origem para o bairro “(...)por causa de um casarão que ali existia, com um grande varandão com pilares em toda a sua volta. O povo referia-se ao lugar com bairro da casa dos pilares, o que deu origem ao nome atual”.
Bom, levando em conta o registro histórico, apesar da importância, Pilares era um bairro de passagem, mesmo! Os bairros limítrofes, Engenho de Dentro, Engenho da Rainha e Engenho Novo – nomes atuais – eram originariamente terrenos de grandes engenhos de cana de açúcar. Boa parte do terreno destas localidades, e em consequência parte do bairro de Pilares, pertencia ao Estado (ainda como Império). Em 1873 foi construído um grande pátio para manutenção dos trens no bairro de Engenho de Dentro, substituindo a oficina São Diego na Central do Brasil. Este pátio pela sua dimensão estendia-se entre Engenho de Dentro e Pilares. Para se ter uma ideia, atualmente o terreno abriga o Condomínio Arena Park, uma Empresa de Ônibus intermunicipais e o Estádio Olímpico João Havelange – o Engenhão.
                Na segunda metade da década de 60 começam as construções do Conjunto dos Ferroviários pela União Federal do então Estado da Guanabara, em terrenos do Império transformados em bens do Estado no início do século XX. Estas moradias destinavam-se aos funcionários da estatal responsável pela malha ferroviária em todo território nacional, a Rede Ferroviária Federal, criada em 1957 no governo de Jucelino Kubitschek. Na edição N° 101 do Cinejornal Informativo de 1968, produzido pela Agencia Nacional, veiculado nos cinemas da cidade, há uma menção sobre a inspeção da construção do Conjunto dos Ferroviários pelo então ministro dos Transportes Mario Andreazza (Governo Costa e Silva):

TRENS ELÉTRICOS CORRERÃO AGORA ATÉ CAXIAS: É o Ministro Andreazza que inspeciona as novas obras; inclusive o Conjunto Residencial do Engenho de Dentro que permitirá a moradia de cerca de 3 mil famílias de ferroviários em casas e apartamentos. Recebe assim, a baixada da Guanabara, uma notável contribuição administrativa que certamente impulsionará o progresso daquelas áreas satélites do Estado da Guanabara (Cine Informativo, Agência Nacional, 1968).

                “Baixada da Guanabara”? “Áreas Satélite”? Um conjunto popular implantado por uma das maiores estatais brasileiras é construído e sequer mencionam o bairro. Eu digo: Pilares. Pelo menos o “Engenho de Dentro” é citado. Mais uma vez, o bairro é mera área de passagem da “baixada da Guanabara”.
                Talvez a injustiça começa a ser amenizada com a construção do 2° maior Shopping do Rio de Janeiro, o Norte Shopping, em 1986. Então o “Moro perto do Méier” passou a ser “Moro perto do Norte Shopping”. Porém o Norte Shopping não fica em Pilares em sim no Cachambi. Mas é tão perto que a referência por tabela funciona melhor do que a Escola de Samba. Pois é, a Escola de Samba Caprichosos de Pilares, que já pertenceu ao antigo primeiro grupo e ao Grupo Especial da Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro atualmente é do Grupo  B, abaixo do Grupo de Acesso. Daí ninguém quer jogar em time que perde. “Moro perto da Portela” – em Madureira; “Moro em Padre Miguel” – próximo à escola de Samba Mocidade” – é muito mais honroso.
                Atualmente o bairro foi descoberto pelas grandes construtoras imobiliárias e pelo menos quatro grandes condomínios foram construídos ou estão em fase de construção. Tanto as áreas comerciais, o baixo índice de violência, o serviço de transportes públicos, a proximidade do Engenhão e dois grandes Shoppings próximos, tem feito de Pilares um novo Xangrilá suburbano. O preço do metro quadrado na região valorizou mais de 60% em 2010, segundo o Índice FIPE ZAP de preço de imóveis. Não sei se isto colocará o bairro no status que merece – com sua importância histórica para cidade. Mas certamente, com ou sem bolha imobiliária, a cara do bairro muda e se renova. Por traquejos do destino, Pilares deixou de ser um bairro de passagem, dos cavalos da Família Real, do Conjunto Residencial do Engenho de Dentro, para ser um polo de residencial da Zona Norte. Mais do que passar, agora é, honrosamente, um bairro para ficar.
               







Referências:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Euclides_da_Cunha








http://www.paroquiadesaobenedito.com.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=19&Itemid=27


*Todos acessados em 10/06/2011.