quarta-feira, 28 de março de 2012

Retiro

Eu me retiro
para um começo de oração
para uma frágil reflexão
ágil gás do fogão que me distrai

Eu me retiro
para o último andar suburbano
para os débitos que acumulam na gaveta
para a preta fagulha na avenida

Eu me retiro
para o eco do banheiro
para o meio das canções incidentais
inférteis no ralo de alumínio

Eu me retiro
para o arroz com feijão
para o pão e para o escândalo
do Brasil dos telejornais

Eu me retiro
para o lar da Mário Carpenter
para o beijo de boa noite
para o calor açoite que nenhuma brisa noturna/
                                   daria conta.

Se me retiro
Não que a alma esteja pronta
Nem que o gosto do dia tenha sido digerido.
Absolutamente.

segunda-feira, 26 de março de 2012

O Lobo e o Cordeiro

O lobo é bicho-gente
O lobo é bicho caliente
O lobo é bicho que sente
Bicho pra frente

Cordeiro é bicho doente
Cordeiro é bicho demente
Cordeiro é bicho indolente
Fora do foco, bicho sem mente

O lobo é o olho da gente
Cordeiro é o medo vidente
O lobo canino saliente
Cordeiro é coragem dormente

O lobo é o cordeiro tosado
Cordeiro é o lobo calado
O lobo é o cordeiro tesudo
Cordeiro é o pavor no escuro

O lobo é o brado insolente
O cordeiro é o silêncio inocente.

sábado, 24 de março de 2012

Amor Lexotânico

Deixa eu respirar o tempo lexotânico e inábil
Deixa eu escorrer minha língua lábil
Este açucarado de carícias molejas
Caído meu braço no dorso que estejas

Dentes mamilam peles rubras e mirongas
decifradas aos pés de pentagramas
Eletrofeitos salivas vem em ondas
Gigantescos gemidos decigramas

Se fiz corte em tua tez cigana
é por que me fiz ainda réu na grama
terrível terrosa nesta unha estranha
que finca levíssima no teu paladar

Se foste vítima da minha fome escura
Suga única na bunda grandiloquente
Se sente o pulsar penismático que dura
madrugadas encalças a virilhar na mente

Acabo-me, derreto-me, desfragmento-me
Como sono ópio vaporizado
Na esfumacência de suas entranhas
Sinto-me cru aprisionado

Então me consuma como se fosse mesmo
O gosto teso de um fato consumado
Como regalo na boca púrpura amora
Caroço mordido sorvido provado e acabado.

Prevalecendo pela manhã - lexotânico
Neônio, totalmente amalgamado
Não sei se sou eu microorgânico
Se sou cadáver, se sou amado.


domingo, 11 de março de 2012

Para arrebentar grades enferrujadas

         Os meus chegados sabem que sou fã de tecnologia. Não daquela que nos separa, nos individualiza, mas aquela que promove informações, agrega valores e experiências renovadoras. Uma destas experiências é a capacidade de ser assistir o que quiser, da forma que quiser, os programas de televisão pela internet. Quando garimpo, vejo que a televisão aberta ainda não está perdida, mas, certamente a forma de ser ver esta televisão está com os dias contados.
          Enquanto não temos uma banda acessível e barata para todos e um streaming sem aqueles travamentos irritantes, a melhor forma é montar uma boa lista, esperar uns minutos, e ver ou rever, os programas postados no You Tube. Muitos destes programas em canais das próprias emissoras e com qualidade HD. Daquelas pérolas que garimpo destaco duas: o humorístico Agora é Tarde, da BAND e o Samba na Gamboa da Tv Brasil. É tamanho o prazer do entretenimento assim como o abismo de distinção que há entre eles.
          Danilo Gentilli, faz o humor no pastiche dos talk shows, na fórmula bem copiada por Jô Soares, e desconstruindo as espinhas dorsais que poderiam torná-lo enfadonho. Um apresentador, três "ancoras", e uma banda, uma puta banda, o Ultraje à Rigor.
Diogo Nogueira acertou no carisma, no bom humor e na elegância na forma de receber seus convidados, neste campo, craques da música popular, do samba e do pagode. O ambiente informal dá leveza à acompanhamentos precisos e quase cirúrgicos, nas percussões, nas cordas e nos sopros. No último que assisti, e postei, tivemos a delícia da voz e do suingue de Luiz Melodia.
          Mesmo que às vezes pareça um retrocesso, esperar o vídeo "dar corda", no buffering, para depois tocar e, em HD, isso ainda é realidade, a tecnologia - dispor dela - é um deleite.
Eu que sou um pessimista racional ou um futurista melancólico, vejo um traço de esperança, quando a tal grade da televisão tradicional está prestes a arrebentar. Curtir a tv pela internet já é uma realidade, uma liberdade de escolha, pedra cantada por Nelson Hoineff e outros bons estudiosos de tv.
          Humor e Música são apenas opções na cédula virtual. Viva a liberdade de escolha! Menos leis restritivas e mais programas e formatos ao alcance dos dedos.




Postado no Facebook, Rio,11/03.

sábado, 10 de março de 2012

Um ontem em forma de Homem


Queimam folhas secas e sós
Queimam em nós
Infâncias, decalques, feridas
Queimam lembranças de rua

Cola de arroz
Cola de suor
Papel fino
Finura no vento

Raspei o tampão do dedo
Se tenho dedo ainda
É por que há gols
Muitos a serem feitos

Se escondem em mim <moleque!>
Atrás de velhos carros
Atrás de postes cinzas
Se escondem em mim <moleque!>

Há o tempo e é breve
É injusto
É puro
É amargo
É doce
É amargo-doce
Em mim reminiscências e distâncias
Escurecem em outras instâncias
E a delicadeza de ser assim
Um ontem em forma de homem.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Entrevista - Helena Martinho da Rocha

Leiam em "Ensaios e Críticas de Cinema" a instigante e provocadora entrevista exclusiva com a cineasta e produtora Helena Martinho da Rocha (Clique Aqui). Dentre outras obras destacam-se "O Bispo do Rosário" de 1993 e "Benguelê" de 2007. Abaixo, uma degustação de "Benguelê", já exibido na europa e "Menção Honrosa" no Afro-Film Festival da Bahia em 2010.