sábado, 8 de outubro de 2011

Clarice, poema?

"qual uma faca íntima/ ou faca de uso interno, /habitando num corpo /como o próprio esqueleto"
(João Cabral de Melo Neto)

Tremi, e desta vez foi de propósito
Não fingi que era flâmula
nem que era anemômetro
não fingi que teço trama
não fingi que era fenômeno

Foi real, tremi, me espantei
Vi um gozo que não era meu
Ouvi um sotaque que não era meu
Senti-me mal, engoli, arrotei

Denso como pecado de treva
Falível como recado que herda
Furtos tórridos de péssimas lembranças

Desta vez, senti frio na espinha
Pesou o olho turvou-me a língua
Escorreu até sangue...
Como um piercing mal aplicado
Como indelicado e invasivo cateter

Era éter, é chumbo, será mercúrio
Não fingi - senhores - apenas lembrei
só lembrei, de Clarice Linspector

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